"Teu amor pelas cousas sonhadas era teu desprezo pelas cousas vividas."

sábado, 30 de outubro de 2010

luz.


Sou um poço de gestos é o que sou e ainda nem todos foram esboçados em mim. Sou um poço de palavras que curvam meus lábios, ainda que em pensamento. Sou um poço de sonhos que nem ao fim chegaram.

Porque minha alma é como um raio de sol que brilha e isola do chão onde jaz o monte de estrume que é meu corpo.

sábado, 23 de outubro de 2010

dissonância.


Aonde vai dar tudo isso?

Quando eu era criança caminhava nas tardes ensolaradas, com os pés procurando folhas secas para pisar, com rosto aberto ao vento, leveza no ser e toda certeza que chegaria onde queria.

Mas nada é como deveria ser.

Às vezes não sei onde cheguei. Não sei se queria ter chegado.
Hoje acordei em um imenso descampado, com o corpo sujo, esfarrapado e com um frio a percorrer-me pela espinha.
... São descaminhos que me movem através do infinito. O que será amanhã, não faço a menor idéia e gosto dessa sensação.

O que vos escrevo são espectros da minha dissonância com a vida.

sábado, 16 de outubro de 2010

abismo indefinidamente abstracto da vida.


Não fizeram, Senhor, as vossas naus viagem mais primeira que a que o meu pensamento, no desastre deste livro, conseguiu. Cabo não dobraram, nem Draia viram mais afastada, tanto da audácia dos audazes como da imaginação dos por ousar, igual aos cabos que dobrei com a minha meditação, e às praias a que, com o meu El, fiz aportar o meu esforço.

Por vosso início, Senhor, se descobriu o Mundo Real; por meu o Mundo Intelectual se descobrirá.

Arcaram os vossos argonautas com monstros e medos. Também, na viagem do meu pensamento, tive monstros e medos com que arcar. No caminho para o abismo abstracto, que está no fundo das coisas, há horrores, que passar, que os homens do mundo não imaginam e medos que ter que a experiência humana não conhece; é mais humano talvez o cabo para o lugar indefinido do mar comum do que a senda abstracta para o vácuo do mundo.

Apartados do uso dos seus lares, êxuis do caminho das suas casas, viúvos para sempre da brandura de a vida ser a mesma, chegaram por fim os vossos emissários, vós já morto, ao extremo oceânico da Terra. Viram, no material, um novo céu e uma terra nova.

Eu, longe dos caminhos de mim próprio, cego da visão da vida que amo, cheguei por fim, também, ao extremo vazio das coisas, à borda imponderável do limite dos entes, à porta sem lugar do abismo abstracto do Mundo.

Entrei, senhor, essa Porta. Vaguei, senhor, por esse mar. Contemplei, senhor, esse invisível abismo.

Ponho esta obra de Descoberta suprema na invocação do vosso nome português, criador de argonautas.


Foto: Desconhecido
Texto: Vicente Guedes

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Visceralmente...


Sempre na minha vida, situações e convivências, eu fui sempre, p'ra todos, um intruso, um estranho sempre. No meio de amigos, parentes, colegas, fui sempre sentido como alguém de fora.
Fui sempre, em toda parte e por todos, tratado com simpatia. Mas essa simpatia foi sempre isenta de afeição. Para os mais naturalmente íntimos fui sempre um hóspede, que por hóspede, é bem tratado, mas sempre com atenção devida ao estranho e a falta de afeição merecida pelo intruso.
Hoje estou lúcido como se não existisse. Meu pensamento é em claro como um esqueleto, sem os trapos carnais da ilusão de exprimir.

Foto: Desconhecido.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

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"Fatica d'amore, tristezza
Tu chiami una vita
che dentro, profonda, ha nomi
di cieli e gioardini
E fosse mia carne
che il dono di male trasforma"

Versos: S. Quasimodo
Foto: Desconhecido.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Vida.


Da sacada do último andar sobre o horizonte infinito, na inocência da noite que surge, ao vento para o começo das estrelas, meus sonhos vão por acordo de ritmo com a distância exposta para as viagens às terras incógnitas, ou supostas, ou somente impossíveis.