"Teu amor pelas cousas sonhadas era teu desprezo pelas cousas vividas."

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Por lugar algum



(...) Slimane, companheiro dos dias de infortúnio, sabe tão bem quanto eu que os últimos momentos da noite são estranhamente difíceis. Nenhum abraço chega para atenuar a dor da separação.
Quando o teu corpo está ausente, Slimane, pergunto-me que caos terrível irromperá de mim. Em que lugar destas terras, desta aridez da alma, terei a possibilidade de morrer por enjoo de tudo?


A vida, aqui, é monótona e triste - feita à margem das estrelas de areia que vão serpenteando até o árido horizonte as engolir.
Uma espécie de miséria escorre, gota a gota, dentro de mim. Sinto-me como o viajante que observou os homens e as coisas, e prosseguiu viagem sem deixar rasto - sabendo que, também ele, se apagará da face da terra.
Continuo a procurar o silêncio e a paz. Mas o amor não passa de inquietação, e a beleza dos seres é efémera.
Aprendo a passar por eles, a olhá-los atentamente para poder esquecê-los.
A vida, afinal, talvez seja uma encenação do desespero. Aïn-Sefra desaparece na fúria das lamacentas águas. Faltam-me as forças para fugir daqui. Uma língua de fogo atinge a mão que escreve.
O meu corpo será encontrado sob os escombros. Aquela que viveu no lume das areias morrerá afogada. Mas enquanto o destino não se cumpre, puxo as rédeas a Ziza, acendo um cigarro, e cavalgo em direcção a lado nenhum.”

Texto: Al Berto
Foto: E. Ferreira

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