A minha alma partiu-se como um vaso vazio.
Cahiu pela escada excessivamente abaixo.
Cahiu das mãos da creada descuidada.
Cahiu, fêz-se em mais pedaços do que havia loiça no vaso.
Asneira? Impossivel? Sei lá!
Tenho mais sensações do que tinha quando me sentia eu.
Sou um espalhamento de cacos sobre um capacho por sacudir.
Fiz barulho na queda como um vaso que se partia.
Os deuses que ha debruçam-se do parapeito da escada.
E fitam os cacos que a creada d'elles fêz de mim.
Não se zangam com ella.
São tolerantes com ella.
O que eu era um vaso vasio?
Olham os cacos absurdamente conscientes,
Mas conscientes de si-mesmos, não conscientes d'elles.
Olham e sorriem.
Sorriem tolerantes à creada involuntária.
Alastra a grande escadaria atapetada de estrêllas.
Um caco brilha, virado do exterior lustroso, entre os astros.
A minha obra? A minha alma principal? A minha vida?
Um caco.
E os deuses olham-o especialmente, pois não sabem por que ficou alli.
Versos: Álvaro de Campos
Fotografia: Anônimo (tokyotimes.org)
1 comentário:
Oi anjo!
Lindo de ler e sentir o seu texto!
" A minha alma partiu-se como um vaso vazio."
É de emocionar viu!?
Beijos com carinho
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